terça-feira, 17 de julho de 2012

Estranhezas

            
           Por suposto, conforme reza a cartilha do bom senso, quem está aflito quer ser acalmado, o insone quer dormir, o desesperado quer paz, o ocupado quer descanso, o doente quer sarar, o angustiado quer alívio. Nem sempre. Aliás, pouquíssimas vezes. Na verdade, na maioria das vezes, quando acalmamos alguém, ocorre desta pessoa achar que estamos subestimando sua aflição, que não estamos levando em consideração seu sofrimento, que “pimenta nos olhos do outro não dói”.
            O insone, que acreditamos que precisa dormir, está, embora reclame, firmemente decidido a usar suas noites para tecer seus pesadelos, ao invés de entregar-se aos sonhos – que podem ser de outra ordem.
            O desesperado, este que mobiliza todos ao redor com seu sofrimento atroz, pede muito mais um outro que se compadeça dele, do que um outro que lhe acene com a paz e com o abandono de seu teatro particular – cuja cena só faz sentido se expectadores se desesperarem junto.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

As consequências do medo


         Escrevo a partir da leitura de um romance ficcional: “Nêmesis” – de Philip Roth, editado pela Companhia das Letras.
         A história se passa no verão de 1944, durante a Segunda Guerra Mundial. A cidade de Nova Jersey é assolada por um surto de poliomielite, ameaçando as crianças da cidade com a paralisia e a invalidez permanente, quando não com a própria morte.
         Sobre este pano de fundo, o destaque é dado a um homem jovem, Bucky Cantor, de 23 anos, responsável por um pátio de recreação de uma escola. É a história da tragédia pessoal desse homem, tomado pelo medo e pela culpa. E aqui eu proponho uma inversão: é a história de como um homem tomado pelo medo e pela culpa, invadido por esses dois sentimentos, entregue a eles, transformou sua própria vida numa imensa tragédia.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Flash 7: Eu não sei se isso é para mim.


 Fique tranqüilo. Não é. Nada é “para mim”. Nem a chuva, nem a música, nem o ódio,... nem o amor é “para mim”.
Que eu não me sinta na obrigação de pegar nada.
Eu só pego quando eu acho que algo é dirigido a mim. Tentarei esclarecer esse “pegar”. É quando, diante de uma situação, eu me sinto perseguido ou privilegiado, me sinto escolhido ou excluído. Se me sinto assim, tenho que confrontar ou estar à altura. Tenho que dar conta ou deixar de vez.

domingo, 15 de abril de 2012

Quem pode exercer a psicanálise?


 Muitas pessoas perguntam: “quem pode exercer a psicanálise e quais as diferenças entre essa prática e as executadas pelos psicólogos e pelos psiquiatras?”.
Já vimos no artigo anterior , “Como surgiu a psicanálise” , que, no Brasil, a profissão de psicanalista não é reconhecida, ou seja, o psicanalista como tal não existe no Código Brasileiro das Ocupações. Isso não impede que existam pessoas com formações diferentes que exerçam a psicanálise e conseqüentemente, acarreta diferentes maneiras de trabalhar.
O mais freqüente é encontramos pessoas que trabalham com a psicanálise e são formadas inicialmente em Psicologia ou em Medicina – o que permite que a pessoa tenha um CRP ou CRM para efeitos legais. Não existe faculdade de Psicanálise no Brasil e em nenhum outro país. Coloca-se então a questão da formação do psicanalista como algo que se dá fora do âmbito universitário. Voltarei a isso daqui a pouco. No momento, consideremos que os profissionais psicanalistas no Brasil são geralmente aqueles que têm a formação em Medicina ou Psicologia.

domingo, 8 de abril de 2012

TRÊS


     Das discussões do grupo de terça (“Cinema e Psicanálise”) pude pensar que se o ser humano se constrói a cada momento, o seu psiquismo acompanha esse movimento, se construindo no processo. Nesse sentido, a realidade psíquica poderia ser resignificada pelas experiências da vida, se assim permitíssemos. Pensando nessa “permissão”, assisti ao filme do diretor alemão Tom Tykwer (com título original Drei – Três – no Brasil divulgado como “Triangulo Amoroso”). No filme três pessoas constroem uma possibilidade única de viver seus afetos, compondo um quadro de rara beleza.